Três meses após ser desclassificado do Wildlife Photographer of the Year de 2017 por usar um tamanduá empalhado na foto vencedora, o brasiliense Marcio Cabral disse ao G1 que não forjou a cena. O fotógrafo devolveu o dinheiro do prêmio – o equivalente a cerca de R$ 6 mil.
O Museu de História Natural de Londres explicou ao G1 que o 1º lugar ficou vago. “A seletiva é feita às cegas e seria injusto para quem participou da competição que a escolha fosse refeita”, afirmam os organizadores do concurso.
“Como os fotógrafos agora são conhecidos, bem como todos os detalhes sobre as imagens, seria impossível fazer uma escolha objetiva de um vencedor da categoria.”
Pelas regras, Márcio fica impedido de participar de qualquer edição do Wildlife Photographer of the Year. Ele disse que não vai recorrer da decisão e alegou falta de transparência do museu na condução da investigação.
“Foi uma denuncia anônima e o museu também não divulgou o nome dos especialistas [que compararam as imagens]. Mas a decisão é monocrática, então não tem o que fazer”, afirmou. Por outro lado, o fotógrafo alegou não ter “nenhuma prova” ou outra foto do tamanduá.
“Se eu for naquele parque e conseguir uma evidência, logicamente vou enviar para eles, mas não é minha prioridade.”
A investigação
O museu disse ao G1 que três especialistas foram acionados para analisar as imagens logo após o recebimento da denúncia, em 23 de março.
“A equipe de cientistas envolvidos na investigação era composta por dois especialistas em mamíferos e um especialista em taxidermia no Museu, além de dois especialistas externos; um em mamíferos da América do Sul e outro em tamanduás.”
Em três semanas, o grupo concluiu que Marcio Cabral posicionou um tamanduá empalhado próximo a um cupinzeiro no Parque Nacional das Emas, em Goiás, para fazer a foto que lhe rendeu o primeiro lugar na competição.
Futuro
O fotógrafo brasiliense acredita que “o pior já passou”. “Tomei prejuízo, exposições e contratos foram cancelados, mas agora já normalizou”, disse.
“Eu estava numa situação até confortável, com prêmios e exposições. Então, isso me fez levantar do sofá, estudar mais. Somente neste ano, já fui pra Nova Zelândia, México, Atacama, Chapada e, agora, vou pra Bonito.”
“Agora, a prioridade é produzir.”
Mas e o tamanduá?
Marcio Cabral sustenta os argumentos que defendeu em abril, de que a foto feita no Parque Nacional das Emas não foi forjada. Segundo ele, a imagem foi registrada durante 30 segundos para captar as luzes emitidas pelos cupins e o tamanduá foi capturado com o flash.
“A intenção era fazer a imagem do cupinzeiro. Você não espera que um animal vá passar por ali, mas tem que estar preparado. Com flash manual, você pode congelar o momento que quiser. Dá pra capturar qualquer animal que passe por ali, até uma coruja.”
O fotógrafo disse ao G1 que não tem mais interesse em falar sobre o assunto, mas levantou a suspeita de que a foto enviada pelo denunciante pode ter sido alterada. “Podem ter modificado a posição do bicho, os pêlos e as cores. Não dá pra afirmar, mas pode ter acontecido.”
“Não quero mais mexer nisso. O que acrescento é que a pessoa que fez a denúncia – que teve o trabalho de ir lá no parque, fazer a foto – enviou um arquivo em jpeg. Um formato que pode ser modificado.”
“Quando você participa de qualquer concurso, tem que enviar o arquivo em raw, para saberem que não é uma montagem. Então, pra ganhar tem que ser um raw, mas pra perder pode ser um jpeg?”, questionou.
20 anos de fotografia
Marcio trabalha com fotografia há cerca de 20 anos, sendo 15 profissionalmente. Formado em geografia, ele começou a se envolver com as câmeras no final do curso, durante o trabalho de conclusão.
“Fiz um inventário turístico de Cavalcante, em Goiás, e das cachoeiras e comecei a perceber que era isso o que gostava de fazer”, explicou.
“Comecei a ganhar dinheiro com as fotos e fui fazendo a transição.”
Fotógrafo de paisagem, ele registra ambientes de dia e de noite, debaixo d’água, em cavernas, e, eventualmente, capta animais. “Para fotografar animal não é preciso tanta pós-produção. É ajustar o foco e apertar o botão no momento certo”, explicou.
“Já a foto de paisagem é outra pegada. Cada dia é diferente. Então, tem que esperar os melhores momentos, as nuvens certas, aquele avermelhado do céu.”
As fotos panorâmicas são a especialidade. Em 2016, ele entrou no Guinness World Record com a maior foto panorâmica subaquática do mundo. O registro, no rio Sucuri, em Bonito (MS), tem 495 megapixels, mas deve ficar pequeno em breve.
“Vou pra Bonito de novo, fazer uma foto na Lagoa Misteriosa com mais de 800 megapixels.”
Os anos de experiência lhe renderam, somente em 2018, quatro prêmios internacionais. Em janeiro, uma foto de Marcio tirada na Chapada dos Veadeiros (GO) foi o primeiro lugar na categoria máxima do Internacional Garden Photography of the Year. A imagem, de alta exposição, mostra um campo iluminado de “chuveirinhos” – planta típica do cerrado.
*Por Luiza Garonce, G1 DF