Após dez anos, justiça derruba lei de MS e proíbe queima de palha de cana

A Justiça Federal derrubou uma lei estadual aprovada em 2007 pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul atribuindo a 18 municípios da região sul a competência para decidir sobre autorizações para queimada da palha de cana. A decisão foi tomada em março deste ano pelo juiz da 1ª Vara Federal de Dourados, Moisés Anderson Costa Rodrigues da Silva, em ação civil pública movida pelo MPF (Ministério Público Federal).

O caso se arrastava desde 2008, quando o MPF entrou com ação para derrubar a lei estadual – sancionada em janeiro de 2007 pelo então governador André Puccinelli – e conseguiu uma liminar na primeira instância, mas o governo do estado e as empresas agrícolas recorreram ao TRF (Tribunal Regional Federal) da 3ª Região, em São Paulo, e conseguiram liberar a queimada.

Em 2013, no entanto, o próprio TRF reconsiderou a decisão após recurso da Procuradoria Regional da República e manteve a proibição, que vigora até hoje. No mês passado, após uma década de demora, a Justiça finalmente deu uma sentença para o caso e derrubou em definitivo a lei estadual.

Os municípios abrangidos pela decisão judicial são Anaurilândia, Angélica, Bataiporã, Caarapó, Deodápolis, Douradina, Dourados, Fátima do Sul, Glória de Dourados, Itaporã, Ivinhema, Maracaju, Nova Alvorada do Sul, Nova Andradina, Novo Horizonte do Sul, Rio Brilhante, Taquarussu e Vicentina.

Ibama – “Julgo parcialmente procedente a demanda e reconheço a nulidade das autorizações de queima da palha da cana de açúcar expedidas pelos municípios com base na Lei Estadual 3.357/2007 e determino ao Ibama que promova o licenciamento ambiental da atividade, mediante prévia elaboração de estudo de impacto ambiental”, afirmou o magistrado na sentença.

Na ação, acolhida pela Justiça, o MPF alegou que o uso do fogo para preparo da colheita da cana-de-açúcar constitui prática danosa ao meio ambiente, além de afetar a saúde dos trabalhadores e da população.

“A Lei Estadual 3.357/2007 é inconstitucional e ilegal, pois autoriza o uso indiscriminado da queima da palha da cana, independentemente de licenciamento e prévio estudo de impacto ambiental, além de violar o sistema constitucional de repartição de competências”, afirmou o MPF, ao defender a colheita mecanizada por trazer melhores condições de salubridade aos trabalhadores e aumento da demanda por trabalho qualificado.

Afeta até outro país – Para o juiz Moisés da Silva, a lei estatual prevê de forma genérica o uso do fogo como método despalhador, independentemente da realização de prévio estudo de impacto ambiental. Segundo o magistrado, os danos ambientais porventura decorrentes da autorização ultrapassam a esfera local, já que a região fica perto da divisa com outros estados e da fronteira com o Paraguai.

“A região de Dourados encontra-se em zona de fronteira seca, a menos de 120 km do vizinho, Paraguai. A eventual dispersão de gases tóxicos, oriundos da queima da palha da cana-açúcar, provocará danos que transcendem a uma municipalidade, o que pode, inclusive, gerar danos a grande parte do cone sul do Estado de Mato Grosso do Sul, chegando, provavelmente ao Estado de São Paulo”, afirma a sentença.

Extrapolou – Na decisão, o juiz afirma que a Assembleia Legislativa não poderia autorizar um município a avaliar dano ambiental que supera sua extensão territorial, “vulnerando entidades federativas congêneres, e, até mesmo, entidades soberanas, como é o país vizinho”.

“Hoje não estamos na época da coivara, queimada da mata para limpeza do solo, que herdamos dos índios. Dispomos de um moderno parque agroindustrial sucroalcooleiro, que exporta tecnologia e, ainda assim, vale-se de uma prática daninha, prévia ao povoamento do Brasil pelos portugueses”, sentenciou o magistrado federal.

 

*Campo Grande News