Mario Jarnoval Vieira, 56, está de emprego novo. Desde o começo de novembro, ele passa os dias entre fileiras de macieiras, videiras e pessegueiros. O trabalho, quase todo manual ou com o auxílio de pequenas ferramentas, consiste em, por exemplo, podar galhos e embrulhar as frutas no pé para protegê-las dos insetos e dos pássaros.
Pelo serviço na Fazenda Realeza, ele recebe um salário de cerca de R$ 1.500, menos do que a média nacional que é de R$ 2.012 para os homens. Mesmo assim se diz satisfeito. “Aqui trabalho no ar puro, num lugar bonito, cuidando das plantas”, diz Mario Jarnoval. “É muito melhor do que o cheiro da gasolina”, comenta, referindo-se ao seu emprego anterior, de frentista em posto de gasolina.
A descrição da cena, com plantações de maçã e uva, pode trazer à lembrança a paisagem de uma região temperada. Mas o agricultor está em Cristalina (GO), a 130 quilômetros de Brasília, no coração do cerrado brasileiro -uma área mais conhecida pelas plantações extensivas de grãos como soja e milho e onde a temperatura ultrapassa com facilidade os 30 graus Celsius.
Maior geradora de empregos em GO
E são justamente culturas à primeira vista exóticas para o Centro-Oeste e atividades como as executadas por Mario Jarnoval que ajudaram Cristalina a se tornar um dos municípios que mais criaram empregos em 2016, na contramão do que ocorre no mercado de trabalho nacional.
De janeiro a novembro, o mercado de trabalho de Cristalina teve um saldo positivo de 3.079 novas vagas, de acordo com números do Cadastro Geral do Emprego do Ministério do Trabalho.
O município é o líder de emprego em Goiás e quinto no ranking nacional.
“O segredo desse número está no aumento da produção de culturas que complementam a produção de soja e milho e que empregam muito mais pessoas para a mesma área plantada”, afirma Aléssio Maróstica, presidente do sindicato rural do município.
Entre essas culturas complementares já tradicionais de Cristalina que tiveram avanço em 2016 estão o feijão, tomate, cebola, batata, cenoura e o alho -produtos que experimentaram alta de preços recentemente. A fruticultura é mais recente, mas é a atividade que mais emprega.
Soja emprega pouco; frutas contratam mais por hectare
A diversidade explica o fato de Cristalina estar criando mais empregos do que outras cidades onde o agronegócio também é forte. “Na soja, você precisa de cem hectares plantados para criar um emprego. Na batata e cenoura, com 10 hectares já se gera um emprego. Com cebola e alho, apenas três hectares são suficientes. E com a fruticultura, você cria dois empregos por hectare”.
Mas por que essas culturas precisam mais de mão de obra e o avanço delas ajuda na criação de empregos?
“Porque são culturas muito mais artesanais do que as plantações de grãos, as commodities”, responde Edson Carlos da Silva, proprietário da Fazenda Realeza, e um dos pioneiros da fruticultura na região. “Não se prestam tanto à mecanização, você precisa de gente cuidando delas o tempo todo e é um cuidado manual”.
Aléssio Maróstica dá mais uma explicação. “Os grãos são coletados pelas colheitadeiras e vão direto para a indústria. Eles podem ser grandes, pequenos, bonitos ou feios. Já as frutas, a batata, o tomate, são vendidos para o consumidor final na feira ou no supermercado e precisam ser bonitos. Eles têm de ser selecionados e limpos na hora da colheita, ainda na fazenda. E quem faz isso é gente”.
Altitude e irrigação
Cristalina consegue essa diversidade por duas razões. Uma natural. A cidade está a cerca de 1.200 metros acima do nível do mar, o que faz com que haja uma variação grande na temperatura que pode em um mesmo dia chegar a 32 graus durante o dia e a 15 graus à noite, mas sem ocorrência de geadas.
A outra explicação é artificial: a irrigação. Cristalina tem a terceira maior área irrigada do Brasil com 56 mil hectares, segundo o último levantamento da Agência Nacional de Águas (ANA) e da Embrapa, de 2014. Os dois primeiros são municípios próximos, ambos em MG: Unaí (61 mil hectares) e Paracatu (58 mil hectares).
UOL- Asdrúbal Figueiró