Estudo realizado por pesquisadores da Embrapa concluiu que de 1977 até 2013, as ações de quarentena desenvolvidas pela Empresa impediram a entrada de 75 diferentes espécies de pragas agrícolas no Brasil. De 2014 a 2016, mais quatro espécies foram barradas. Todas essas pragas, que incluem insetos, ácaros, nematoides, fungos, vírus e bactérias, possuem um predicado em comum: são exóticas. Isso significa que não existem no País e, por isso, não há formas conhecidas para combatê-las.
Para se ter uma ideia, a entrada de apenas uma praga exótica no início dos anos 2000, a lagarta Helicoverpa armigera, causou danos de cerca de 1,7 bilhão de dólares aos cofres nacionais. Se multiplicarmos esse valor pelo número de pragas interceptadas, é possível estimar que o trabalho de quarentena desenvolvido pela Embrapa poupou centenas de bilhões de dólares à economia do País.
O estudo aponta ainda outro dado relevante e inédito: as pragas exóticas retidas não estão relacionadas ao país de origem, mas sim à parte da planta em que são identificadas. Segundo o pesquisador Marcelo Lopes, autor do artigo resultante desse estudo publicado na revista Pesquisa Agropecuária Brasileira (PAB), a incidência de pragas interceptadas em oliveira, lírio, maçã e videira foi 21 vezes maior do que em milho, trigo, arroz e algodão. O que as difere é a forma de importação do material vegetal, já que as quatro primeiras são intercambiadas por propagação vegetativa, ou seja, na forma de mudas e estacas, enquanto as quatro últimas são enviadas por sementes.
“O fato de que o milho, o trigo, o arroz e o algodão são as espécies com maior volume de importação – o milho ocupa o primeiro lugar com 755 importações – e, mesmo assim, apresentam baixo índice de contaminação por pragas – de 0,4 a 3% – corrobora a associação entre a contaminação e a parte da planta intercambiada. O importante é que esse levantamento leva à recomendação de que o envio de sementes é uma forma segura de intercâmbio internacional de culturas agrícolas”, ressalta o pesquisador.
A equipe envolvida no estudo, que inclui, além de Lopes, os pesquisadores Norton Benito, Márcio Sanches, Denise Návia, Vilmar Gonzaga, Marta Mendes, Olinda Martins e Arailde Urben (Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, DF) e Abi Marques e Fernanda Fernandes (Embrapa Quarentena Vegetal, DF), vai repassar essa e outras informações decorrentes do estudo ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) durante o seminário “Ciência & Tecnologia no enfrentamento de ameaças sanitárias à agropecuária brasileira”, que será promovido pela Embrapa ainda neste ano.
Pragas não listadas
Outro dado muito importante revelado pelo estudo é a alta quantidade de pragas ausentes não regulamentadas (ANR) detectada no material vegetal avaliado. Trata-se de pragas que não existem no Brasil e que não estão incluídas na lista de espécies de importância quarentenária elaborada pelo Mapa. Segundo Lopes, 47 espécies, ou seja, mais da metade das pragas interceptadas pela Embrapa, pertencem à categoria de ausentes não regulamentadas. “Essa predominância constitui uma informação importante para o sistema de defesa vegetal no Brasil”, enfatiza o pesquisador, já que não possuem o status de quarentenárias, ou seja, não constam da lista do Mapa, e, por isso, podem escapar das barreiras sanitárias.
Para concluir que a praga é realmente exótica no Brasil, são feitos exaustivos testes pela equipe da Estação Quarentenária de Plantas da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, que é a instituição oficialmente designada pelo Mapa para proceder a quarentena de todas as plantas que entram no Brasil para fins de pesquisa. A análise envolve procedimentos laboratoriais para verificar se o material vegetal está contaminado por insetos ou microrganismos. Se as pragas detectadas existirem no Brasil, as plantas são tratadas e liberadas. Se forem exóticas, o material é incinerado.
Segundo o pesquisador, a informação sobre a alta incidência de ANRs também será informada ao Ministério. “Esperamos que esse estudo possa resultar na incorporação dessas espécies à lista de pragas quarentenárias, a exemplo do que já aconteceu em outros países da Europa, por exemplo”, afirma. O status de quarentenária é extremamente importante porque funciona como um alerta para evitar a entrada da praga. “As pragas que não estão presentes nessa lista, mas não existem no País nos tornam vulneráveis. Por isso, vamos informá-las ao Mapa para que sejam alvo de estudos para futuras regulamentações”, complementa Lopes.
Ele acredita que os resultados gerados pelo estudo podem ser utilizados como padrões referenciais para o funcionamento de estações quarentenárias no Brasil. “Como não há informações sobre taxas de interceptações disponíveis na literatura, as estatísticas geradas pelo trabalho podem contribuir para a gestão de riscos nessas estações”, constata. O estudo oferece ainda informações sobre as pragas mais frequentemente encontradas nas plantas intercambiadas que são os fungos, seguidos por vírus, ácaros e nematoides.
Quarentena: questão de segurança nacional
O intercâmbio de material vegetal entre os países é uma atividade imprescindível ao enriquecimento do patrimônio genético e para a geração de novas variedades agrícolas. No Brasil, cerca de 80% dos alimentos consumidos têm origem exótica. Um dos piores problemas enfrentados pela agricultura é a ocorrência de organismos nocivos que levam à redução da produção de alimentos, fibras e bioenergia. Esses organismos se enquadram no conceito de praga.
A quarentena de plantas abrange ações voltadas a prevenir a introdução e disseminação de pragas agrícolas e, por isso, é prioridade para a Embrapa desde a sua criação na década de 1970. A atividade começou com a criação da Estação Quarentenária na Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia em 1977. Ao longo de mais de três décadas, com o crescimento do comércio internacional e do fluxo de turistas, as atividades de quarentena se intensificaram, levando a Empresa a criar, em 2014, uma nova Unidade exclusivamente voltada às atividades: a Embrapa Quarentena Vegetal. O objetivo é modernizar a análise das sementes e outros materiais de propagação que são introduzidos no País ou intercambiados com outras instituições de pesquisa.
O artigo “Interceptações de pragas quarentenárias e ausentes não regulamentadas em material vegetal importado” faz parte de uma edição especial temática da revista PAB sobre pesquisa, desenvolvimento e inovações em face de ameaças sanitárias para a agropecuária. A versão na íntegra está disponível na versão digital da publicação no link.
Por Assessoria / Embrapa