Sempre em busca de alguma palavra de ordem com jeito de pedra para ser colocada no bodoque, ou de sofismas que pareçam argumentos para vencer discussões sem ter razão, a militância petista está usando as investigações que cercam membros do governo Michel Temer para atacar os defensores do impeachment. É como proclamar empate num jogo de 7 a 1.
Alto lá! Temer errou ao escalar ministros sob investigação? Claro que sim! Podemos nos dar por satisfeitos com a declaração formal de inocência que eles prestaram ao presidente em exercício? Obviamente não. O Presídio Central tem um número muito pequeno de réus confessos. A grande maioria é formada por bandidos que se dizem inocentes injustiçados. Não podemos, no entanto, incorrer na armadilha que a retórica petista, sempre ardilosa, pretende armar.
Como afirmou recente editorial de O Estado de São Paulo, para o PT só o PT é legítimo. Do STF ao TCU, passando pelas duas casas do Congresso Nacional, tudo mais deixou de ser legítimo quando seu governo perdeu a maioria. Boa parte, talvez a maior, da população que saiu às ruas em favor do impeachment não votou na chapa Dilma e Temer. Essa chapa foi uma escolha petista. Entre 2010 e 2015, se não eram exatamente unha e carne, Dilma e Temer não eram água e azeite. Ambos, com seus partidos, PT e PMDB, somaram votos e esforços para terem e manterem o poder. Os 54 milhões de eleitores que Dilma diz serem seus como moeda de cofrinho, somavam sufrágios dos dois maiores partidos brasileiros à época. Os votos estritamente pessoais dos personagens da chapa eram pouco significativos no pleito. Bastaria que o PMDB de um Estado de porte médio mudasse de lado na eleição de 2014 para que a dupla vencedora perdesse a eleição. Ao dizer que os 54 milhões de votos lhe pertencem, Dilma: 1) volta a mentir; 2) pratica um furto eleitoral retórico contra o PMDB e contra Michel Temer; e 3) esquece que já perdeu quase todos esses votos.
Retornando ao primeiro parágrafo. Entre os milhões que se empenharam pelo impeachment nas ruas e praças do Brasil, muitos foram eleitores de Dilma e Temer e outros tantos, não. Os que sempre souberam onde tudo ia parar e os que ficaram sabendo no andar da carroça uniram-se em torno da mesma causa. Ao cabo de 13 anos, o desastre saíra do horizonte previsível e podia ser observado na soleira da porta. Não havia múltiplas escolhas. Era Dilma ou Temer. Desalento consumado ou fio de esperança. Era respeitar a Constituição com o correto processo de impeachment ou transformar o país numa casa de tolerância, terra sem lei de um povo invertebrado.
A escolha entre Dilma e Temer, tornada possível no contexto da ordem jurídica, se enquadra num princípio moral universal, enunciado por Aristóteles em Ética a Nicômaco: “O mal menor, em relação a um mal maior, está situado na categoria de bem. Pois um mal menor é preferível a um mal maior. E aquilo que é preferível sempre é um bem, e quanto o mais preferível este seja, maior bem é”. Escolher o bem, desnecessário dizê-lo, é um dever moral. Escolher o mal ou rejeitar o bem por desapreço ou interesse próprio é boa parte do problema que acabou levando a presidente ao impeachment e muitos líderes políticos às barras dos tribunais. Que para lá vão todos quantos tenham feito por merecer.
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* Percival Puggina (71), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.