Bioinvasão em rios de MS: peixes exóticos estão competindo com nativos e destruindo nascentes
Introduzidos principalmente pelo homem no momento de pesca ou quando escapam em córregos durante prática da psicultura, os peixes exóticos protagonizam uma “conta” que chegou e está causando sério desequilíbrio nos rios de Mato Grosso do Sul. Desta forma, órgãos ambientais estão unidos em uma força-tarefa e agora fazendo o “serviço oposto”, ou seja, orientando e incentivando as pessoas a ficarem com o pescado, caso seja de algumas destas variedades. Veja a lista no decorrer da matéria.
Para quem não se lembra, polêmica semelhante ocorreu quando o javali europeu, que não pertence à fauna brasileira, foi introduzido no país e passou a causar prejuízos em lavouras de Mato Grosso do Sul, deixando muitos produtores em alerta com a “bioinvasão”. Atualmente, por ser uma espécie exótica e com grande poder de se adaptar e reproduzir, sem falar no comportamento predatório, o javali tem a caça permitida no Brasil.
No decorrer do tempo, esta espécie inclusive teve a crescente distribuição pelo território nacional e passou a ameaçar o ecossistema, tendo o controle do javali autorizado pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), em 2013.
Agora, o mesmo órgão encabeça uma campanha e percorre casas de pesca, estabelecimentos comerciais de isca viva, barcos hotéis e outros locais estratégicos de Corumbá e Porto Murtinho.
“É uma campanha que estamos buscando realizar desde abril, porém, começou nesta última semana. E agora, no começo de novembro, teremos a Piracema, mas, a intenção é tentar uma resolução no Ministério da Pesca ou do Meio Ambiente, com a intenção de liberar a pesca dos exóticos o ano inteiro. Tem todo um desequilíbrio ambiental que está ocorrendo, em relação às espécies nativas, então, teria o pesque e leve o ano inteiro, porém, isto depende da mudança de legislação”, afirmou ao Jornal Midiamax a superintendente do Ibama, Joanice Lube Battilani.
Tucunaré é peixe invasor facilmente encontrado por pescadores
Entre os predadores está o tucunaré, considerado um peixe mais “agressivo” e com “fator dominante”, de acordo com Joanice. “Nós encontramos, por diversas vezes, colônias de pesca, em que pescadores profissionais pescavam e depois vendiam muito o tucunaré, que causa danos a ictiofauna local. Ele ‘entrou’ no rio e não é da bacia do alto Paraguai, mas sim da Amazônia, por exemplo”, disse.
Dos rios em risco estão o Taquari, Correntes, Aquidauana, Miranda, todos que descem para o Pantanal. Além disso, espécies invasores também estão presentes nos rios Nioaque, Miranda, Coxim, Apa e o Paraguai. “Existe, claro, a distribuição natural das espécies, em que, ocasionalmente, pode ter migrado, porém, não é o que ocorrem em todos estes casos de peixes invasores”, falou a superintendente.
Outro exemplo é a tilápia, comumente criada em tanques-rede na bacia do Paraná. “Acontece, principalmente nos casos de piscicultura com esta espécie, do animal escapar e aí se torna um problema ambiental, por competir com o alimento e não ter predador em alguns casos. E aí tudo isto leva a um declínio ambiental. É o mesmo caso do javali, que se tornou praga ao competir com espécies nativas e o tucunaré, que destrói nascentes por ser um peixe agressivo e com fator dominante”, argumentou Joanice.
O subcomandante da PMA (Polícia Militar Ambiental), Diego Ferreira, disse ao Jornal Midiamax que esteve recentemente reunido com integrantes do Ibama e dá apoio na campanha que alerta pescadores amadores e esportistas sobre a necessidade de controlar os peixes exóticos, principalmente na bacia do Pantanal sul-mato-grossense. “Estamos organizando o trabalho em campo e de orientação”, explicou.
Outro órgão envolvido é o Imasul (Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul), que atua também na distribuição de panfletos e cartazes, principalmente após constatarem que os rios da bacia do Alto Paraguai apresentam grande diversidade de peixes, sendo catalogadas cerca de 386 espécies nativas, as quais atraem, anualmente, milhares de pescadores esportivos, amadores ou profissionais cadastrados no Sistema de Pesca do Instituto de Meio Ambiente do Estado.
Espécies exóticas são séria ameaça à diversidade biológica
Segundo a força-tarefa, a introdução de espécies exóticas invasoras, muitas vezes, ocorre de forma intencional e se torna uma séria ameaça a diversidade biológica. Assim, a ausência de predadores naturais, abundância de presas sem defesas eficientes contra as espécies introduzidas e distúrbios em áreas naturais, frequentemente “criam vantagens para espécies exóticas invasoras sobre espécies nativas”.
Ainda de acordo com os especialistas, as espécies invasoras são consideradas a segunda maior causa de extinção de espécies no planeta, afetando diretamente à biodiversidade, à economia e à saúde humana. Dentre as espécies invasoras de peixes no Pantanal, destacam-se o tucunaré, tambaqui, tambacu, pirarara, corvina, entre outras.
“Estamos divulgando a campanha sobre a necessidade de não soltar os peixes exóticos, que não são nativos da bacia do alto Paraguai, bacia do Pantanal e que forem capturados. Desta forma, estamos focando nas espécies ditas acima. Quando fisgarem, que capturem e embarquem porque, quando solta, está ajudando a dispersas estas espécies”, explicou ao Midiamax o analista ambiental do Ibama, Reginaldo Yamaciro.
Conforme o analista, que visitou lojas de iscas na região do Indubrasil, pescadores da região já informaram que a pirarara, por exemplo, já mudou o local e reprodução. “Este é um grande bagre, grande peixe de couro da bacia do Araguaia Tocantins, que estava se reproduzindo na região do Rio Aquidauana até o Camisão. E aí já tivemos a informação de que subiu e está na região de Corguinho, então, é um problema muito sério a questão da bioinvasão, o termo técnico é este”, explicou.
Assim como ocorreu com o javali, que é competência do Ibama, o objetivo neste momento é alertar sobre o pesque e solte, que é para espécies nativas. O contrário é para as espécies exóticas, as quais não tem cota.
“O importante é que sejam retirados do rio. Obviamente que, se a pessoa quiser levar para casa, tem que passar na polícia ambiental, é necessário fazer a guia de controle de pescado e levar. Se não quiser, pode deixar no barco hotel, na pousada, acampamento ou come. São peixes muitos esportivos e gostosos. Também a orientação é doar para creches e orfanatos, então, tem a questão ambiental e a social”, disse.
De acordo com Yamaciro, a campanha vai se estender por todo o ano de 2024. “O pescador somente precisa respeitar a legislação e não pescar perto de cachoeiras, corredeiras, assim como com as espécies nativas. E esta é uma campanha de caráter permanente e temos casos semelhantes ocorrendo no Rio Grande do Sul, em São Paulo e Minas Gerais. Tem o pirarucu e não se acha peixes da região, sendo esta uma espécie amazônica, o maior peixe de escamas do Brasil. E aqui temos o tucunaré, desde 1982, que agora já está sendo pescado em Cáceres (MT), na Serra do Amolar, no Rio Paraguai, se dispersando, invadindo territórios e interferindo na reprodução das espécies nativas”, explicou.
Dos dias 11 a 16 de outubro, segundo o analista, as equipes estarão percorrendo regiões do Rio Aquidauana. “Vamos aproveitar o feriadão e ir para Porto Grego, em Terenos, onde começou a incidência da Pirarara, depois Miranda, Anastácio, Aquidauana, depois barcos hotéis em Corumbá, Ladário. Em seguida por dentro do Pantanal, ali na Estrada Parque, Passo do Lontra, Porto da Manga e Porto Murtinho. Voltamos por Jardim, Guia Lopes, passamos no 21, que é Bonito e Anastácio no Rio Miranda e voltamos para Campo Grande no dia 16”, finalizou.
*Midiamax – Graziela Rezende