STF forma maioria para manter suspenso piso salarial da enfermagem
O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria de votos para manter a suspensão da lei que criou o piso salarial dos profissionais de enfermagem.
Os ministros julgam no plenário virtual a decisão individual do relator, ministro Luís Roberto Barroso, que suspendeu a norma até que sejam analisados os impactos da medida na qualidade dos serviços de saúde e no orçamento de municípios e estados.
O entendimento de Barroso foi seguido pelos ministros Ricardo Lewandowski, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e GIlmar Mendes
O ministro André Mendonça, Nunes Marques, Edson Fachin divergiram e votaram para derrubar a suspensão.
No voto em que foi alcançada a maioria, o decano da Corte, ministro Gilmar Mendes, afirmou que “não se pode perder de vista os eventuais efeitos perversos que a lei, cheia de boas intenções, pode produzir na prática”.
“É evidente o estado de penúria pelo qual atravessam alguns estados e municípios brasileiros e a dependência significativa desses entes em relação aos Fundos de Participação dos Estados e Municípios, para o atendimento de suas despesas básicas. Nesse contexto, é preocupante o resultado que medidas normativas como essas podem vir a gerar”, argumentou.
O STF julga uma ação apresentada pela Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos de Serviços (CNSaúde), que questiona a validade da medida por entender que a fixação de um salário-base para a categoria terá impactos nas contas de unidades de saúde particulares pelo país e nas contas públicas de estados e municípios.
O julgamento no plenário virtual é uma modalidade de deliberação em que os ministros apresentam seus votos diretamente na página da Corte na internet, sem a necessidade de que o caso seja discutido em sessão presencial ou por videoconferência. A análise do caso está prevista para terminar no dia 16 de setembro, mas pode ser interrompida se houver pedido de vista (mais tempo para analisar o processo) ou pedido de destaque (que levaria o caso para julgamento presencial).
Barroso se posicionou a favor de manter sua decisão individual no domingo (4), ou seja, tornar sem efeitos o piso até que sejam analisados dados detalhados dos estados, municípios, órgãos do governo federal, conselhos e entidades da área da saúde sobre o impacto financeiro para os atendimentos, o impacto nos serviços de saúde e os riscos de demissões diante da implementação do piso. O prazo para que essas informações sejam enviadas ao STF é de 60 dias.
“Não se pode questionar a relevância dos objetivos que moveram o legislador, nem a conveniência da valorização das categorias profissionais de que depende a adequada prestação dos serviços de saúde. No entanto, sem prejuízo dos questionamentos acerca de vício de iniciativa, constitucionalização superveniente de lei de iniciativa parlamentar e violação à autonomia federativa, é preciso atentar, neste momento, aos eventuais impactos negativos da adoção dos pisos salariais impugnados. Pela plausibilidade jurídica das alegações, trata-se de ponto que merece esclarecimento antes que se possa cogitar da aplicação da lei”, afirmou o ministro.
Divergência
O ministro André Mendonça foi o primeiro a discordar do relator. Ele entende que não há elementos que justifiquem uma interferência do Judiciário para suspender a norma.
O ministro Nunes Marques também defendeu uma autocontenção do STF no caso e disse que vários estados pagam salários superiores ao piso fixado. “Conforme dados do Conselho Federal da Enfermagem, a maior parte dos profissionais está em entes subnacionais cuja média salarial, aliás, até supera ou ao menos se aproxima bastante do piso salarial ora objeto da ação”.
Marques disse ainda que o Supremo não possui “todas as variáveis desta delicada equação, ao menos neste momento. Isto é, não se sabe ao certo se haverá mesmo demissões em massa ou não, bem como se haverá falta de leitos hospitalares”.
O ministro Edson Fachin disse que suspender o piso pode dificultar a busca por soluções orçamentárias e o diálogo entre os poderes.
“No presente caso, são os próprios titulares dos direitos fundamentais sociais (ou seja, os trabalhadores) que reclamaram a norma exaustivamente debatida no Congresso Nacional. Nada justifica, teórica ou empiricamente, que esta Corte Suprema tenha melhores condições de definir o que os próprios representantes do povo, com a reivindicação da sociedade civil organizada em diversas etapas do processo legislativo, deliberaram”, escreveu.
Histórico
A lei aprovada pelo Congresso fixou o piso em R$ 4.750, para os setores público e privado. O valor ainda serve de referência para o cálculo do mínimo salarial de técnicos de enfermagem (70%), auxiliares de enfermagem (50%) e parteiras (50%).
Conforme o Dieese, o incremento financeiro necessário ao cumprimento dos pisos será de R$ 4,4 bilhões ao ano para os Municípios, de R$ 1,3 bilhões ao ano para os Estados e de R$ 53 milhões ao ano para a União.
Já a Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas (CMB) indicou incremento de R$ 6,3 bilhões ao ano. Foi apontada uma possibilidade de demissão de 80 mil profissionais de enfermagem e fechamento de 20 mil leitos.
Por Márcio Falcão e Rosanne D’Agostino, TV Globo e g1 — Brasília