Na manhã do dia 30 de abril, Alcinópolis recebeu a visita de Edmara Barbosa, escritora e roteirista de telenovelas brasileiras e que tem se destacado por adaptar para a Rede Globo antigos sucessos de seu pai, Benedito Ruy Barbosa. Além disso, Edmara tem se dedicado a seu novo programa “Pantanal sem Fronteiras” que conta a história do bioma de forma detalhada: suas origens, suas águas e seus guardiões.
Alcinopolis encantou o olhar da escritora com o Templo dos Pilares e demais pontos turísticos, guiados pela bióloga Bruna Barbosa, e Nahur Tito Queiroz.
O Regional MS acompanhou essa visita e conversou com ela. Acompanhe a entrevista na integra:
De onde surgiu a ideia de vir para Alcinópolis?
Edmara Barbosa: A gente está fazendo um documentário, um programa, sobre Pantanal, a origem do Pantanal, estamos fazendo uma coleta de dados, gravando com as pessoas pra trazer pra mídia, televisão ou redes sociais, o Pantanal de verdade que vai além da ficção. A gente tem a novela de um lado, contando essas histórias imaginadas e o imaginário, e a ideia e trazer um pouco da vida real do povo pantaneiro e de coisas que a gente encontra na pesquisa, de histórias que a gente conhece, áreas que a gente visita e fica sabendo que existem e que não chega até a novela até por conta do formato. Aí, acabou que a gente estava gravando esses dois primeiros programas que é “A origem” e “As águas” e o terceiro programa são “Os guardiões”, o povo que formou o Pantanal. E nos viemos aqui atras dos registros, das inscrições rupestres, e entender um pouco sobre essa ocupação muito antiga, a chegada desse homem nesse bioma. Viemos para cá por ser uma característica daqui.
Além de Alcinópolis quais os outros locais por onde vocês passaram?
EB: A gente esteve na Serra do Amolar, em Corumbá, e nas áreas do município: Moquém, na Barra, fomos no Acorizal, na Serra Negra. A gente implantou alguns sistemas de agroflorestas, porque eu trabalho de um lado contando histórias e de outro plantando florestas. A gente tem uma parte de plantio que a gente fez com o IHP, do Coronel Rabelo, e a gente plantou quatro áreas. Também plantamos uma área no Guató, na baia da Barra a gente plantou uma, fizemos uma no Moquem de oásis pra bicho e a gente teve a felicidade de ter a visita de uma onça, e fizemos uma área na Serra Negra e vamos fazer uma área também em Acorizal. Isso na parte de recuperação ambiental. Gravei algumas coisas ali também, de alguns impactos da queimada, e isso me assustou bastante, porque é um sistema vivo: o rio está integrado com a floresta, que está integrada com a população local. Fiquei muito impactada com o que vi, o fogo queimou 25% da Serra, e dá uma sensação de tristeza, ver a falta de cuidado que a gente está tendo com o meio que faz a gente ficar vivo, com todos os elementos, com todos os recursos da natureza que possibilitam a vida humana na Terra. Em Corumbá, conheci o projeto da Marcia que é um projeto que representa muito para aquela comunidade, principalmente para as crianças, porque é um projeto de futuro, de formação artística. Estivemos também em Cuiabá, e a gente gravou na comunidade de São Gonçalo, na Conceição, Poconé, em Coxipó do Ouro, fomos a Chapada. Começamos ali porque pra nos ali e a origem geológica do Pantanal. Também fomos a Bonito, fizemos as águas lá representando um pouco essas águas que nutrem essa Bacia do Pantanal, a gente foi entender um pouco a questão geológica, mas também os aquíferos, conhecer um pouco as grutas, ver um pouco esse sistema chamado vida, que não é natureza, mas é vida, porque uma coisa esta ligada com a outra. Fiquei muito emocionada quando cheguei aqui e cheguei ao Templo dos Pilares: consegui ver o rosto do Guardião do Templo. Dá uma sensação de que tem alguém ali querendo mandar alguma mensagem. Fora isso, quando você sobe ali em cima e vê a área toda preservada, aquele monte de floresta, você para e fica pensando: porque a gente não está olhando pra isso? Porque a gente quer plantar tanta soja? Porque a gente precisa fazer tanta monocultura? Porque a gente precisa impactar tanto o local que traz vida pra gente? Porque a gente está desmatando tudo isso? Porque a gente está minerando em cima de áreas que são reservas de água? Porque a gente está criando gado em cima de áreas que tem que estar sendo preservadas? Então, ficam essas perguntas, e eu gostaria muito de ter respostas. De um lado, temos investido muito nesse modelo de agroflorestas, e estava conversando com a secretaria municipal que dá para fazermos alguma coisa ali na área do Parque, e é uma outra coisa que eu estou tentando levar, porque não adianta a gente criticar um modelo se você não der uma solução pra ele, e a gente tem uma solução. Hoje, temos um grupo de agroflorestores que trabalham só com isso e que tem pesquisado muito pra trazer uma solução pra essa agricultura ser mais rentável. Você tem um país de um lado que é riquíssimo em reserva de água, em clima, em solo que está sendo extremamente impactado por um negócio que não é alimentação. Infelizmente, a gente está sendo controlado pela bolsa de valores, pelo grande modelo de agro que só favorece algumas poucas pessoas que ganham muito dinheiro com isso, que está empobrecendo o povo, empobrecendo o país, que está criando uma leva de pessoas que está passando fome na rua. Quando você tem mais de 70 milhões de hectares degradados, você acaba criando uma massa de pessoas pobres e famintas, e precisa pensar em recuperar essas áreas. Cada um de nós precisa fazer aquilo que a consciência lhe diz, mas tenho tentado encontrar interlocução com muitos agro e pecuaristas, e existe uma grande parte dessas pessoas que estão bem intencionadas, só não tem um modelo. E a gente tem investido também em trazer esse modelo. Porque ver a quantidade de pessoas que temos passando fome, e impensável em um país que é extremamente abençoado em termos de terra, de água e de recursos. E a gente não pode deixar que esses recursos minerais sejam tirados daqui favorecendo o dinheiro, a melhoria do capital de uma empresa que está dentro da bolsa de valores e que tem acionistas querendo ganhar dinheiro com isso enquanto você tem gente aqui que está morrendo de fome. Eu tenho essa visão pra mim muito clara: essa necessidade de mudar o nosso padrão de vida e o nosso modo de olhar pro mundo. É necessário e é urgente porque vai acabar. Já estou um pouco velha pra saber que eu não vou sobreviver para ver essa catástrofe, mas os meus filhos deverão ver e os meus netos e bisnetos com certeza verão. E não é possível que vamos deixar essa herança para os nossos descendentes.
O Programa que criamos é o “Pantanal Sem Fronteiras”, trazemos essa possibilidade de interlocução poque eu quero ouvir as pessoas, tenho que entender o problema do cara que produz, porque ele não consegue olhar para aquela monocultura pobre de soja, de milho e de gado e ver que ali não tem vida. Que está plantando uma série de grãos que estão esgotando o solo. E olhar pro lado, para a floresta, ver como esse sistema funciona e reproduzir isso na própria área de plantio. Tenho tentado apresentar para as pessoas outros modelos, menos engessados, menos exigentes, que possa trazer uma prosperidade para todas as pessoas e não apenas para um pequeno grupo de pessoas.
Quando o Programa vai ao ar?
EB: Ainda estamos trabalhando para colocar no ar. Vou fazer esses dois pilotos, esses dois primeiros programas, um sobre A Origem do Pantanal, e o outro e As Águas, e o terceiro será Os Guardiões. Vou montar esses dois com o material que nos já temos, depois vou apresentar e ver se consigo um espaço em algum canal para veicular. Queremos colocar também nas mídias sociais.
Como as pessoas podem encontrar você e conhecer seu trabalho?
EB: Eu gostaria muito que as pessoas vissem, não o meu trabalho, mas nosso porque juntos nós fazemos o clima e a diferença. Tenho uma empresa chamada “Nós fazemos o clima” que é uma rede de comunicação e gestão de projetos. De um lado, eu crio comunicação e vou criando esses conteúdos, tentando dar um pouco de norte para esses projetos que são maravilhosos e fazem grandes transformações, mas que tem dificuldade muito grande em comunicar, por causa do sistema que a gente vive. Então, a ideia foi criar uma empresa de comunicação, dar o espaço pra todo mundo falar de uma maneira organizada, e a partir disso, convidando as pessoas para conhecerem os projetos divulgados no espaço em que e desenvolvido. É uma tentativa de multiplicar as informações e fazer com que as pessoas acabem se interconectando. Hoje estamos em um canal no youtube e um perfil no instagram, mas estamos próximos a lançar um site. Somos um grupo que, em sua maioria, tem propriedades, e a gente atende: um exemplo é o Projeto Integrado de Pecuária de Leite e Floresta, do Marcos Palmeira, entre outros. O que a gente quer fazer é contar história de um lado e plantar floresta de outro. Nossa primeira preocupação não é ser econômico, o que a gente tem feito é criar modelos, e o projeto começou agora no Pantanal com a novela do papai e que meu filho adaptou e vai acabar em 2027 com o Centenário de Tom Jobim, esse é o Projeto. E nos vamos passar por todos os biomas, fazendo a mesma coisa, contando história e plantando florestas. E é o que eu estou fazendo aqui, conhecendo as histórias pra saber onde e como a gente pode somar, e a gente vai ter outros projetos aqui, a ideia a gora é fazer alguma coisa no Parque aqui em Alcinópolis porque acho que ele tem que ser preservado, e urgente que se faça um acervejo para que seja realmente um modelo para esse trabalho com o fogo que vai revitalizar o que esta seco para poder ficar verde e para que ate que chegue a próxima chuva. Esse e um projeto que a gente tem também que é para os brigadistas e conversei com o pessoal aqui para a gente implantar aqui.
Com toda essa experiência que você viveu aqui em Alcinópolis hoje, o que você diria para os moradores?
EB: Deem as mãos. O primeiro impacto e na população local. Eles são os primeiros a serem atingidos, e a gente tem macrouniversos, e a gente precisa diminuir isso para o micro, e essas pessoas e comunidades que vivem nesse microuniverso precisam começar a se comunicar melhor entre si. Precisa voltar a discutir os próprios problemas, precisam criar as próprias câmaras de discussão, precisam voltar a conversar. Ali eu vi o guardião do templo, mas vi que, lá atras, as pessoas que viveram ali sentavam e trocavam as experiencias, determinavam o que ia ser feito, entre outros. Então e isso, eu diria para que comecem a olhar pra dentro da própria comunidade. Acho importante isso: dar as mãos. Criar um grupo que trabalhe em conjunto com a comunidade e com a própria natureza que vocês têm aqui. Acho que isso que precisamos voltar a fazer: trabalhar em comunhão. A comunidade junta tem mais poder de decisão, mais foco, mais fala.
A equipe de Edmara Barbosa foi guiada pela “Pousada do Peralta” de Bonito – MS.
Jornalista Bruna Souza- REgionalms