Tradicional festa em Figueirão é registradas como Patrimônio Imaterial de MS

O Conselho Estadual de Políticas Culturais aprovou o Registro da  Festa do Divino de Santa Tereza, no município de Figueirão, como Patrimônio Imaterial de Mato Grosso do Sul.

A Festa do Divino

Com a inserção no livro das Celebrações do Patrimônio Imaterial, a Festa do Divino Espírito Santo de Santa Tereza, no Município de Figueirão é reconhecida como uma manifestação cultural religiosa popular e oral, pois envolve os moradores da comunidade onde o passado, os moldes e normas seguidas pela celebração são veiculados pela memória e costumes coletivos.

A festa acontece na fazenda Santa Tereza, da família Malaquias, região da Pontinha do Cocho, em Figueirão. Esse município teve a população estimada em 3.059 pessoas, segundo censo IBGE (2020). A festa é divulgada e frequentada por turistas, festeiros, pesquisadores, produtores culturais, gestores de cultura, jornalistas, artistas, pagadores de promessas, religiosos, políticos e todo tipo de público. Com sua participação, valorizam e mantém essa manifestação cultural viva, além de divulgar o município, colaborando com o desenvolvimento local e a fruição desse Bem Cultural Imaterial.

A festa nesta região deu-se com uma promessa. Seu Domingos Malaquias, filho de Joaquim Malaquias da Silva, conta que tudo começou quando a segunda mulher de seu pai, dona Maria Francelina de Jesus, fez uma promessa por causa de uma epidemia de febre amarela. Seu Domingos ainda hoje é responsável por comandar o evento na comunidade, pagando a promessa todos os anos pela graça alcançada com o remédio para febre amarela salvando muitas pessoas da morte.

Seu Ereduzino Malaquias, chefe do giro e filho de Joaquim Malaquias, fundador da região, conta que cada integrante da comunidade tem uma atribuição, seja na organização, na limpeza ou na cozinha. Todo ano, ao fim da festa, é feito um sorteio que determina quem irá trabalhar no ano seguinte. A fé mantém a tradição do povo há mais de 100 anos.

As etapas da festa

O sorteio do festeiro é realizado em reunião com os foliões no dia da páscoa, para fazer a demarcação do percurso que acontece 50 dias após a Páscoa. Os participantes passam de fazenda em fazenda a cavalo; a comida é gratuita, oferecida pelo dono do pouso. Levam somente rede, cobertor e capa de chuva. São ao todo 14 dias de viagem, chegam muitas pessoas após o término de cada percurso, foliões, promesseiro e até crianças.

A comitiva convida o Seu Ereduzino para a festa e pedem pouso por cantoria (2 cantam e 2 respondem). Agasalham o santo, rezam o terço, pela manhã tomam café, juntam a tropa e pedem a bandeira por cantoria. A toada é uma só, mas a cantoria é diversa como um repente. Foliões e promesseiros acompanham a festa. A rapadura de cana e mamão é um dos alimentos especiais preparados e ofertados.

São mais ou menos 120 pessoas envolvidas na Festa do Divino de Figueirão. No dia é servido o puchêro e a janta é o churrasco. Ao final, a entrega da bandeira para o festeiro que vai guardá-la para a próxima festa, no próximo ano. A tropa é liberada após a missa, reza cantada do Santo Terço com a queima da fogueira e a apresentação da catira.

Alguns moradores locais relatam que a catira foi trazida para a região por boiadeiros vindos de Goiás e Minas Gerais que, ao permanecerem vários dias no lugar, faziam suas rodas de catira. A família Malaquias foi aprendendo paulatinamente os passos e o domínio dos instrumentos musicais. Atualmente, as modas predominantes no catira são copiadas das duplas sertanejas Tião Carreiro e Pardinho ou Vieira e Vieirinha. Em algumas ocasiões os Malaquias chegam a compor seus próprios cantos, como a moda “Dezenove de Maio”, criada pelos violeiros da folia, para festejar o Senhor Divino.

No intervalo das modas, há uma rodada de água ardente (pinga), cuja garrafa é deixada no centro entres as fileiras. Todos tomam a bebida na própria garrafa, passada de mão em mão, ou de boca em boca. O sapateado e o palmeado também sofrem variações criadas por eles a cada ano, com o objetivo de melhorar o desempenho e testar agilidade cada vez mais complexa. Não é qualquer pessoa que pode dançar o catira no dia da festa. Os dançadores são convidados um a um, momentos antes da dança começar.

Em 2021, comemoram-se 112 anos de atuação da comunidade em Santa Tereza e da família Malaquias carregada de simbolismos e rituais religiosos de muita fé. A Fundação de Cultura conclui que a Festa do Divino Espírito Santo de Santa Tereza não se eterniza apenas pela devoção, pela execução das músicas, pela comida, pela bebida ou pelo bate pé e bate mãos. Pode-se afirmar que o conjunto dessas práticas culturais permite ainda hoje a partilha, o encontro e a união entre as pessoas, as famílias, o grupo de foliões, que todo mês de maio se reúnem para agradecer e celebrar a vida.

 

* Karina Lima, FCMS – Fotos: Carlos Diehl