Estado envia proposta para que MS jogue quem recusa vacina para “final da fila”
Batayporã e Chapadão do Sul exigirão assinatura de termo para quem recusar aplicação de imunizante
A Secretaria Estadual de Saúde vai defender junto à CIB (Comissão Intergestores Bipartite) – que reúne secretários de saúde dos 79 municípios sul-mato-grossenses, proposta de determinar em todo o Estado que pessoas que escolhem vacinas contra a covid-19 ficarão no fim da fila da imunização.
Pelo menos dois municípios de Mato Grosso do Sul já adotaram essa medida para evitar que pessoas recusem tomar determinada marca, os conhecidos “sommeliers de vacina”. A regra já vale em Chapadão do Sul e Batayporã.
O secretário estadual de Saúde, Geraldo Resende, faz analogia que “ninguém está em um restaurante para escolher a vacina em um cardápio”. “A vacina não é uma roupa que você vai na loja e escolhe, ou uma carta ou cardápio, que escolhe o que vai tomar ou comer. Vacina boa é aquela que se aplica no braço e quem faz isso presta um total desserviço a saúde pública. Assim, quero propor que os secretários municipais possam tomar decisão e colocar essas pessoas no final da fila”.
O prefeito, João Carlos Krug (PSDB), justifica que há pessoas optando por não se vacinar por achar qual é melhor que outra, atrasando o processo de imunização como um todo, já que os imunizantes vêm conforme fabricação feita pelos respectivos laboratórios e são adquiridos pela União.
“São pessoas pessoas que fazem um ‘sorteio’ de vacina que querem tomar. Põe na cabeça que uma é melhor que outra. Por isso, para que não haja desmotivação em se vacinar, e que sejam aplicadas conforme recebemos, a gente tomou essa medida”.
Segundo ele, essa medida não garante que o morador que receberá somente no final da imunização terá a marca de vacina que quer. “Não há garantia que vai receber no final a vacina que queria, não temos a programação futura de quais vacinas chegarão.
A gente fica preocupado que pode sobrar vacina daqui alguns dias e faltar pessoas pessoas vacinadas, e com isso a gente acaba não controlando [a pandemia], continua tendo pessoas infectadas”, diz Krug.
Ainda assim, ele ressalta que a recusa tem sido apenas de uma parcela muito pequena da cidade, que na última sexta-feira (2) aplicou todas as 1,8 mil doses que foram recebidas. “Trabalho bom das equipes de saúde e a população de maneira geral está respeitando, com raras exceções”, finaliza.
Outras cidades – Quem tentar escolher marca de vacina em Batayporã, a 311 quilômetros de Campo Grande, será encaminhado para o fim da fila de imunização na cidade. O prefeito, Germino Roz (PSDB), acredita que por estarmos vivendo situação atípica, não há escolha por enquanto.
“Não estamos tirando direito da população. O poder público vai oferecer oportunidade para a pessoa. Como ir num posto de saúde, você pode até ir embora achando que o remédio não é bom, mas ele está disponível e está te servindo”, exemplifica.
Nos comentários do Campo Grande News, depois de ser noticiado ontem, essa medida fez sucesso. São diversas pessoas concordando com a decisão, como a leitora Josi Greffe, que escreve: “Está certíssimo! Vacina boa é vacina no braço. Ninguém está sendo obrigado a tomar, então, se não quer, ótimo! Vai lá pro final da fila e fica aguardando a ‘xepa’, simples assim”.
Roz relata que quando chegaram doses da Janssen, de dose única, houve grande procura por parte da população, que faziam ligações para a prefeitura e demais órgãos. “O pessoal da Saúde me ligou, preocupados em causar tumulto. Vi que São Bernardo do Campo disse que quem se recusar iria para o final da fila e decidimos fazer do mesmo jeito aqui”.
Uma das primeiras cidades a decretar essa medida, São Bernardo do Campo (SP) viu cair em 91% a recusa de vacinas, segundo o jornal CNN Brasil, depois de propor essa mudança.
Segundo o prefeito de Batayporã, ainda será feita resolução para permitir que oficializar a medida, mas o alerta feito pelo executivo municipal tem conscientizado a população. “As pessoas têm entendido. Estamos num ritmo bem acelerado de vacinação, mesmo com essas pequenas quantidades de doses estamos cumprindo todos os grupos propostos em PNI”.
Muitas pessoas que querem se vacinar e não estão nem aí para qual vacina será aplicada. A gente não pode ficar refém de uma minoria que escolhe a vacina, tumultuando a oportunidade de outras pessoas tomar”, avalia o prefeito
Ele diz respeitar a escolha pessoal de cada indivíduo, desde que haja doses de vacina para todos. “Se tivéssemos sendo servidos a contento, toda a população, tudo bem a pessoa decidir. A gente recebe vacina contada. Recebemos 100 doses, já cheguei a receber só um frasco. Não posso ficar abrindo essa escolha”.
O leitor Márcio Silva, que tomou a 1ª dose de vacina, acredita que essa ação deveria ter sido tomada desde o início da vacinação. “A situação em que se encontra essa pandemia e algumas pessoas escolhendo qual quer tomar, falta de bom senso. Na fila eu vi pessoas que desistiram porque era Astrazeneca, falavam que a reação era muito forte. Tomei e não tive reação alguma”.
Na Capital – No caso de Campo Grande, a Sesau (Secretaria Municipal de Saúde Pública) informa que não é possível fazer a escolha da vacina, de forma a não atrapalhar o processo de imunização coletiva.
“A pessoa pode optar pela vacinação com a dose que está disponível ou, caso faça questão de determinado fabricante será orientado a se retirar da fila para que não atrapalhe o fluxo de aplicação das doses. Neste caso é comum que a pessoa busque por outro ponto de vacinação para tentar a vacina do fabricante que deseja, e sempre será dada a mesma orientação”, informa a pasta municipal.
Conforme apurado pela reportagem, em Dourados, a PGR (Procuradoria Geral do Município) está avaliando definir termo semelhante ao das cidades que já afirmaram tomar essa medida, para coibir esse tipo de prática.
Até o fechamento desta matéria, a SES (Secretaria Estadual de Saúde) e o Cosems (Conselho de Secretarias Municipais de Saúde de Mato Grosso do Sul) não responderam questionamentos enviados pelo Campo Grande News em relação a qual recomendação é feita para as cidades evitarem essas recusas, bem como se há outros municípios com ações parecidas.
Eficácia – Principal argumento utilizado pelos “sommeliers” de vacinas, como têm sido chamados aqueles que se recusam a tomar algum tipo de imunizante por conta da patente, são as diferentes taxas de eficácia de cada imunizante, além das reações adversas.
Em junho, o Campo Grande News flagrou o momento em que uma mulher se recusou na hora que receberia a vacina por ser Coronavac, alegando que não a tomaria por conta de baixa eficácia.
Os especialistas explicam que cada vacina tem uma porcentagem de eficácia diferente das demais, por uma série de fatores, tais como as condições em que foi testada, do tipo de tecnologia usada na produção e até do contexto em que viviam os grupos analisados.
A imunologista e professora da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), Inês Aparecida Tozetti, explica que a vacina sino-brasileira, produzida pelo Instituto Butantan, é “extremamente segura” e tem algumas características favoráveis tais como poucas reações adversas e a possibilidade de poder aplicada em pessoas com problemas imunológicos.
“A tecnologia de obtenção da vacina Coronavac, através da utilização de vírus inativado tem mais de 70 anos de utilização e é aquela utilizada na vacina da gripe que muitos tomam anualmente”.
Todas as vacinas aplicadas no Brasil são aprovadas pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) por serem seguras e eficientes. Mesmo que algumas apresentem efeitos adversos raros, em geral reduzem expressivamente probabilidade do paciente ter a forma grave da doença e morrer.
Tozetti comenta que a Coronavac pode apresentar eficácia mediana para evitar a infecção, mas quanto a proteção de internação e óbito, este tipo de vacina tem uma eficácia muito maior. “Outras vacinas têm essa mesma limitação, uma delas é a BCG, ou seja tomamos a BCG ao nascimento mas mesmo assim temos muitas pessoas com tuberculose na sociedade, mas temos menos formas graves de tuberculose ocorrendo”.
A imunologista explica que em relação a alguns casos de óbitos de pessoas que foram imunizadas com as duas doses, é preciso lembrar que a eficácia é medida em estudos clínicos e não na vida real. “As pessoas que se voluntariam para o estudo são saudáveis e nem sempre representam numerosamente todas as faixas etárias’
Ela menciona experimento em Serrana (SP), onde houve vacinação de forma rápida e em toda a população adulta com a Coronavac, e que demonstrou excelentes resultados com diminuição de número de internações e mortes. Ainda assim, ela lembra que no atual momento, “não conseguimos ter essa dinâmica em nosso País”.
Vale lembrar que esta patente foi a primeira a ser aplicada em território brasileiro, quando as outras patentes sequer eram consideradas pelo governo federal. “Para qualquer vacina ter o efeito desejado devemos considerar a velocidade de aplicação na população e a cobertura vacinal. Então se aplicamos esta vacina para poucas pessoas e vagarosamente, permitimos que o vírus continue circulando, entrando em contato com as pessoas e algumas desenvolvendo a doença, mesmo que de forma menos grave, mas representando ainda um problema para as pessoas”.
Por isso, ela preconiza que todos tomem vacina quando for possível, respeitando o esquema completo, de uma ou duas doses, dependendo da marca, além de cumpri medidas como uso de máscaras, higiene e distanciamento social. “Com o aumento da cobertura vacinal, e a aplicação de forma mais rápida, mais pessoas estarão protegidas e o vírus circulará menos, teremos então menos casos de infecção”, finaliza.
Por Guilherme Correia – colaborou Helio de Freitas – CAMPO GRANDE NEWS