Policiais civis entregam chaves de celas e não ‘trabalham’ mais com presos

As chaves das delegacias de Polícia Civil de Mato Grosso do Sul (PC-MS) serão entregues e policiais civis não cuidarão mais de pelo menos 900 presos custodiados em 52 delegacias de 50 municípios do Estado. Os agentes da PC ratificaram na tarde desta sexta-feira (27) posição que já vinha sendo avisada, há tempos, às autoridades do governo estadual. A atitude se consolidou com a morte do investigador Anderson Garcia da Costa, nesta quarta-feira (25), que foi atacado por um preso na cadeia de Pedro Gomes, a 315 km da Capital. O governo do Estado foi comunicado da decisão tomada, em assembléia com 500 participantes, no Sinpol-MS (Sindicato dos policiais civis de MS).

A ação irá paralisar as delegacias de todo o Estado, onde os agentes não realizarão qualquer tipo de atendimento aos detentos. “O movimento começou a partir das 16 horas de hoje, quando encerramos a assembleia. A entrega das chaves é simbólica, mostrando que o agente sem chave, não pode nem ele entrar no local. Mas na prática, vamos dar um fim ao desvio de função, que não é de ofício do PCs custodiar presos. Não haverá o fornecimento de refeições e medicamentos aos presos, bem como a liberação para banho de sol; a abertura de celas para familiares, assistência religiosa ou atendimento jurídico”, explicou Giancarlo Miranda, presidente do Sinpol-MS.

Miranda apontou que a categoria está cansada com o descaso de todas as autoridades, que levou a diversos casos de agressão e morte. “Está é uma tragédia anunciada que vai voltar a acontecer. Essa semana culminou com a morte de nosso companheiro, mas isto é uma luta de anos, mas não há boa vontade dos Poderes constituídos, que já passamos por todos e muitas vezes. E enquanto isso, os trabalhadores estão sendo atacados, violentados e mortos. Não vamos ver outros pais, filhos morrerem no exercício da profissão de defender os direitos da sociedade”, desabafou o presidente.

O representante sindical reforçou que o governo está sendo avisado da decisão, que já deveria ter sido tomada há tempos. “Estou presidente a cerca de um mês, mas já participava da direção e esta é uma luta de anos. Mas agora chegamos ao limite da tolerância. Hoje demos um basta, já encaminhamos a decisão ao governo do Estado. Apesar que isto, já vinha sendo avisado há anos e já foi inúmeras vezes relatado também ao atual governo, que nada pontuou até hoje, a não ser reuniões, como a marcada para a próxima terça-feira, onde é nosso prazo. Se houver alguma proposta, resoluções podemos voltar a contribuir de alguma forma”, disse Miranda.

Fora da função, crimes não é mais trabalho do agente

Além de Miranda, outros membros do Sinpol, também falaram do caos da situação e do total desvio de função dos policiais civil. “A morte desta semana já era e vai continuar sendo uma tragédia anunciada, se nós mesmos não paralisarmos isto e preservamos nossas vidas. A qualquer momento um agente pode ser atacado, pois ele é um em todas as delegacias com 10, 20,30 presos. Hoje, o policial civil no interior principalmente, faz papel de porteiro e no geral nunca o seu papel de PCs, investigador. Crimes estão deixando de ser investigados pelo desvio de função e a população é atingida com a falta de resolução dos crimes e pela busca dos bandidos”, apontou Max Dourado, assessor jurídico do Sinpol.

Dourado ainda lembra o papel do Estado e o quanto os policiais civis correm risco. “As delegacias já não oferecem estrutura, mas sua função também é de ser transitória ao preso e não um presídio. Não somos agentes penitenciários e não temos a função e o treinamento que eles possuem. Além de que o agente que prende um acusado, um bandido não pode ficar exposto a ele, como é a realidade. Temos presos em MS há 1,5 ano na delegacia, condenado, como em Itaquirai. Muitos cumprindo pena em Fátima do Sul, Ivinhema, Tacuru ou fora do lugar como o que atacou o Anderson em Pedro Gomes, sendo um caso psiquiátrico”, disse.

O ex-titular do Sinpol, Alexandre Barbosa, agora vice-presidente, mencionou que o Estado além de não cumprir sua função, não dá nem assistência aos ‘violentados’. “Do tempo que passo por isso, o Estado não fez ou faz nada, como nesta semana. Não foi feito nada ao policial e sua família. Como em outro exemplo, uma companheira de Ponta Porã que foi feita refém em um caso, ela ficou abalada, teve que recorrer ao psicologo, mas somente conseguiu com auxilio do Sindicato”, relatou.

Anderson

O policial civil Anderson Garcia da Costa morreu na tarde desta quarta-feira (25), sendo o segundo caso de lesão corporal contra investigadores em menos de uma semana no Estado. Ele levou golpes de barra de ferro na cabeça e no abdômen. Ele foi encaminhado para atendimento médico na cidade de Coxim, mas foi transferido para a Santa Casa de Campo Grande, onde acabou morreu, apesar que muitos afirma que ele já foi a óbito dentro da ambulância, a caminho do hospital.

Segundo o Sinpol, naquele dia, o policial Anderson cuidava sozinho dos presos e foi agredido por um detendo na cabeça e no abdômen. O detento teria um distúrbio psicológico.
“Mas este não foi só caso do Anderson, tendo em vista que 80% das delegacias de Mato Grosso do Sul contam apenas com um policial de plantão”, lembra o presidente do Sinpol.

Lúcio Borges oestadoonline