Preço da carne, além de memes, faz empresário mudar de ramo e oferecer outros cortes para não fechar negócio

Em tempos de memes e discussões nas redes sociais, a do momento tem como personagem principal a carne. Ou então o ovo, como substituto. Por outro lado, com as confraternizações de fim de ano, tem gente que escolhe até peça de picanha como presente de amigo oculto. O fato é que só pode falar do assunto, quem realmente trabalha com este alimento, seja vendendo espetinho seja vendendo marmitex. Para eles, criatividade e atenção são as palavras-chave do momento ao lidar com a clientela.

Alguns dos memes que estão circulando nas redes sociais sobre o aumento da carne — Foto: Montagem/G1MS

O contador e empresário Lydio França, de 53 anos, que há quase uma década comercializa espetos no bairro Santo Amaro, região leste de Campo Grande, continua otimista e inaugurou, nesta semana, o serviço de delivery. “O preço da carne está subindo gradativamente e eu repasso, de 15 em 15 dias, o aumento para o cliente. Neste período, prefiro diminuir a margem de lucro e ganhar no volume. Nós sabemos que houve a seca prolongada, mas, tem certas coisas que fica complicado de entender porque aqui é tudo gado confinado e também existe muita especulação”, questiona.

De acordo com França, que atua somente com espetos de picanha, filé mignon e contrafilé, o cliente quer sempre o mesmo padrão de qualidade. “Eu tenho que fazer tudo na hora, com o arroz compactado, o vinagrete e a mandioca. O espeto também é sempre feito na hora, então, a gente tem que pensar que tudo vai melhor senão faz igual a um monte de gente e sai fechando as portas. Agora, coloquei o delivery e pretendo alavancar as vendas em 30%”, disse.

Empresário diz que mantém otimismo e inaugurou serviço de delivery de espetos esta semana — Foto: Lydio França/Arquivo Pessoal
Empresário diz que mantém otimismo e inaugurou serviço de delivery de espetos esta semana — Foto: Lydio França/Arquivo Pessoal

O também empresário Arnaldo de Souza Araújo, de 32 anos, conta que trabalhou com espetinho por 2 anos e, em seguida, conseguiu negociar um restaurante na rua Yokohama. No entanto, ele oferecia o serviço de self-service e decidiu trocar por marmitex para não “fechar as portas”. “Existe a questão do oportunismo em muitos casos e aí tem o aumento do feijão, do ovo e outros acompanhamentos. Nós trocamos pelo marmitex porque aí é possível dosar a quantidade de carne e conseguir manter o negócio”, explicou.

Ainda conforme Araújo, o restaurante durou apenas 6 meses e agora ele e a esposa montaram uma cozinha industrial em casa para atender aos clientes. “O aumento da carne falou que é de 30%, mas, eu estava pagando R$ 15 no miolo da agulha e esta semana já foi para R$ 22. O músculo para fazer a carne de panela a mesma coisa, então, nossa saída está sendo colocar no cardápio a carne suína e as aves neste dias. Aqui é a nossa única fonte de renda e estamos sendo criativos”, comentou.

Empresário diz que mudou negócio porque com marmitas consegue dosar a quantidade de carne — Foto: Arnaldo Araújo/Arquivo Pessoal
Empresário diz que mudou negócio porque com marmitas consegue dosar a quantidade de carne — Foto: Arnaldo Araújo/Arquivo Pessoal

Com um média de 20 funcionários, o empresário José Camargo Pereira, de 54 anos, disse que precisou mudar o preço do espeto duas vezes em uma semana. Ele possui uma fábrica no bairro Paulo Coelho Machado, região sul da cidade. “Eu trabalho há 6 anos com isso e agora estou sentindo um pouco de dificuldade. As entregas são feitas em toda a cidade, mas, só vou saber dos transtornos na próxima semana, já que houve a mudança no preço. O espetinho de 120 gramas de carne estava a R$ 1,80, depois foi pra R$ 2,10, depois R$ 2,30 e agora está R$ 2,50”, argumentou.

 

Com a alteração dos valores, Camargo fala que está mantendo uma proximidade com os clientes, conversando mais e explicando a variação. “A gente teme uma redução, mas, eu tenho funcionários fazendo espetos de costela, frango, filé de frango, entre outros. Enquanto isso, vamos conversando com os frigoríficos e também com os clientes. Ontem mesmo estava falando com um que fez uma tabela de preços e não quer mandar para refazer, vai tentar manter o mesmo preço até o final do ano. Sobre o aumento do preço, nem preciso falar muito, tem meme na internet o dia inteiro me ajudando”, brincou.

Empresário disse que teve que mudar valor do espeto duas vezes esta semana — Foto: Redes sociais/Reprodução
Empresário disse que teve que mudar valor do espeto duas vezes esta semana — Foto: Redes sociais/Reprodução

O economista Sérgio Torres, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), disse que realmente este é o público “que mais sofre” com os aumentos e dá dicas bacanas. A primeira delas é buscar alternativas de compras por produtos similares.

“Eles ficam com a margem zerada ou até negativa, então, podem buscar alternativas de compras por produtos similares ou então fazer substituições criativas, intercalando o espeto com legumes. Eu sei que pode não ter a mesma aceitação, mas, é melhor do que repassar o preço total. Desta forma, o empresário contra menos contrafilé , por exemplo, somente em função da demanda até que o preço volte a cair”, explicou.

Outra dica, segundo ele, é substituir por outras carnes como frango, intercalando com bacon e calabresa. “Além disso, no caso dos adicionais, uma opção seria atrelar a farofa, arroz, vinagrete com algum deles sendo gratuito ou com desconto, principalmente porque o preço é algo que já vai estar no custo ou então dar um copo de refrigerante. Se ele compra um de 2 litros, consegue distribuir 8 copos. Fica um valor bom o cliente ficará muito satisfeito. O que não pode acontecer é as vendas caírem muito e a pessoa correr o risco de fechar”, lamentou Torres.

Carne teve a terceira maior alta no preço, segundo o Dieese

Campo Grande registrou no mês de novembro a terceira maior alta no preço da cesta básica entre as 17 capitais em que o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) faz o levantamento.

Conforme a pesquisa divulgada nessa quinta-feira (5), o custo da cesta básica passou de 409,30 em outubro para R$ 422,06, em novembro, representando uma alta de R$ 12,72, o equivalente a 3,12%.

Apenas Vitória, no Espírito Santo, com 7,89% e Florianópolis, em Santa Catarina, com 4,45%, registraram variações maiores.

Carne registrou em novembro maior alta do ano, segundo o Dieese, e ajudou a alavancar alta da cesta básica em Campo Grande — Foto: Anderson Viegas/G1 MS
Carne registrou em novembro maior alta do ano, segundo o Dieese, e ajudou a alavancar alta da cesta básica em Campo Grande — Foto: Anderson Viegas/G1 MS

O Dieese aponta que dos 13 produtos que compõem a cesta básica oito registram aumento de preço em novembro na capital sul-mato-grossense: banana (7,55%), manteiga (7,34%), carne bovina (7,02%) – o aumento mais expressivo do ano, açúcar cristal (4,95%), óleo de soja (4,66%), arroz (1,48%), feijão carioquinha (1,46%) – alta depois de 7 meses consecutivos de queda, e farinha de trigo (1,22%).

 

Em contrapartida, quatro itens contabilizaram retração de preços: tomate (-8,92%), batata (-2,41%), café (-1,91%) e pão francês (-0,45%). Já o preço do leite de caixinha apresentou estabilidade no período, com preço médio de R$ 3,56 o litro.

Para adquirir a cesta básica, a entidade aponta que o trabalhador de Campo Grande que recebeu um salário mínimo comprometeu em novembro 45,97% de sua remuneração líquida (salário menos contribuição previdenciária), demandando para isso 93 horas e 2 minutos de sua jornada mensal.

Em novembro, a cesta familiar, com uma quantidade de produtos para atender uma família com dois adultos e duas crianças, apresentou custo de R$ 1.266,18 um aumento de R$ 38,28 frente a outubro.

O custo da cesta familiar apresentou uma equivalência de 1,27 vezes o salário mínimo bruto (sem descontos)

Por Graziela Rezende, G1 MS