“Grandiosa organização criminosa que tem por finalidade cometer homicídios pelas mais variadas motivações”. Dessa forma, o juiz Marcelo Ivo de Oliveira, da 7ª Vara Criminal, definiu em decisão judicial o grupo alvo de investigação em Campo Grande, cujo comando é atribuído à família Name. Em operação realizada nesta sexta-feira (27), o Gaeco (Grupo de Atuação Especial e Combate ao Crime Organizado) saiu às ruas para cumprir 23 mandados de prisão e 21 de busca e apreensão contra suspeitos de formar uma milícia especializada em execuções de inimigos, entre eles os empresários Jamil Name e Jamil Name Filho, além de guardas municipais, policiais civis, funcionários da família, um militar do Exército, um policial federal e um advogado.
Está escrito no despacho que conversas obtidas do aplicativo WhattsApp, no dia 18 de abril do ano passado, mostram que nesta época foi iniciada “a maior matança já vista na história de Mato Grosso do Sul”. Em diálogo que seria de Jamil Name Filho com interlocutora, ele se diz chefe do grupo de extermínio “criado para executar e eliminar inimigos e desafetos da Família Name, seja por motivos de ordem profissional (negócios) ou mesmo pessoal”. Nessa troca de mensagens, ressalta “que matarão da pessoa mais simples à mais importante dentro deste Estado da Federação, utilizando-se da seguinte frase: “Sai a maior matança da história do MS”, de picolezeiro a governador´”, conforme transcristo.
Para o magistrado, essa passagem demonstra “a altíssima periculosidade da organização criminosa aparentemente liderada pela família Name. Pelo menos quatro assassinatos recentes são obra da organização, traz o texto. As vítimas são Ilson Martins Figueiredo, Marcel Costa Hernandes Colombo, o “Playboy da Mansão”, Orlando da Silva Fernandes, o “Bomba”, e Matheus Coutinho Xavier, estudante morto por engano.
De acordo com a investigação, o grupo é altamente organizado, com quatro núcleos: a liderança, a cargo da família Name, a gerência, a atividade de apoio (logística, segurança e suporte), onde entram os agentes de segurança pública, e a execução, ou seja, os pistoleiros executores de homicídios. Em maio, o guarda civil municipal Marcelo Rios foi preso com um arsenal destinado à milícia. A esposa de Marcelo é uma das testemunhas chaves e chegou a ser ameaçada depois de fazer relevações importantes para o desenvolvimento das investigações.
Pelo que foi apurado, vinha da família Name toda a garantia de apoio logístico para execução dos crimes, desde compra de armamento a veículos, e também para o pagamento de propina a fim de proteger os envolvidos.
Vítimas – A motivação dos assassinatos citados no despacho é diversificada e leva a nomes famosos em Mato Grosso do Sul, como do empresário de Ponta Porã Fahad Jamil e Jorge Rafaat Toumani, apontado como chefe do tráfico na região, executado em 2016 em uma cena digna de cinema, tamanha a artilharia pesada utilizada.
O servidor público Ilson Martins, 62 anos, teria sido morto, em junho de 2018, por estar envolvido com o desaparecimento de Daniel Alvarez Georges, filho de Fahd Jamil, “pessoa muito próxima de Jamil Name”. Nas investigações, há a informação de que “Jamilzinho”, como é chamado, “havia permanecido de 30 a 40 dias na casa de seu padrinho Fahd Jamil na cidade de Ponta Porã/MS”.
Ocorrida em outubro do ano passado, a execução de Marcel Costa Hernandes Colombo, 31 anos, o “Playboy da Mansão”, foi em razão de desavença antiga com Jamil Name Filho, relata a peça judicial.
Orlando da Silva Fernandes, 41 anos, o “Bomba”, por sua vez, morto ao sair de estabelecimento no Jardim dos Estados, em Campo Grande, também em outubro do ano passado, era o ex-chefe de segurança de Rafaat, que teria entregado aos executores a rotina do ex-patrão.
A quarta vítima relacionada, o estudante Matheus Coutinho Xavier, 20 anos, foi executado por engano, no dia 9 de abril deste ano. O alvo, na verdade, era o pai dele, o capitão reformado da Polícia Militar, Paulo Roberto Teixeira Xavier, indicado como ex-responsável pela segurança de Jamil Name. As mortes têm, em comum, o uso do mesmo tipo de armamento.
Delegado – A milícia, conforme evidenciou o trabalho investigativo, tinha dois pistoleiros responsáveis por cumprir as ordens de execução, identificados como Juanil Miranda Lima e José Moreira Freires. O segundo, conhecido como Zezinho, acrescenta ao caso mais um nome de vítima de execução bastante conhecida, o do delegado aposentado Paulo Magalhães, assassinado aos 57 anos, em 2013.
A execução de Magalhães não consta da decisão judicial. Mas o assassinato dele levou à condenação de Freires, no ano passado, como executor. O mandante e a motivação não foram identificados durante todo o processo.
Mesmo condenado por esse crime, Freire aguardava em liberdade o julgamento de apelação da sentença a 18,6 anos de prisão. Ainda assim, foi identificado como envolvido no assassinato do filho do policial aposentado.
As 23 pessoas relacionadas como ligadas à organização, pelas provas apuradas até então, são suspeitas dos crimes de organização criminosa, porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, homicídios e demais crimes correlatos.
Nomes – Foram alvo de mandados de prisão preventiva: os guardas municipais Alcinei Arantes da Silva, Marcelo Rios, Rafael Antunes Vieira e Robert Vítor Kopetski, o militar do Exército Andrison Correia, os pistoleiros José Moreira Freire e Juanil Miranda Lima, os policiais civis Vladenilson Daniel Olmedo e Márcio Cavalcanti Da Silva, Eltom Pedro de Almeida e Flávio Narciso Morais da Silva, além de Jamil Name e de Jamil Name Filho.
Foram alvos de prisão temporária o advogado Alexandre Gonçalves Franzoloso, os policiais civis Elvis Elir Camargo Lima e Frederico Maldonado Arruda, os guardas municipais Igor Cunha de Souza, Rafael Carmo Peixoto Ribeiro, Eronaldo Vieira Da Silva, o policial federal Everaldo Monteiro de Assis, além de Euzébio de Jesus Araújo, Luis Fernando Da Fonseca e Rudney Machado Medeiros.
Das 23 pessoas com mandado de prisão, 19 foram localizadas. As buscas, em 21 endereços, levaram à apreensão de uma papelada, além de computadores, a serem usados como prova sobre o funcionamento da milícia. A quantia de R$ 160 mil em dinheiro foi apreendida. Também foram recolhidos pelas equipes cheques em nome de terceiros, armas dos calibres 38, 22 e 12, munições, aparelhos celulares, inclusive os conhecidos como “bombinhas”, que são descartados após o uso.