A comercialização de fertilizantes no Brasil nunca esteve tão atrasada, segundo empresas do segmento. As vendas mais lentas refletem um produtor receoso em decorrência de quebras de safras e problemas climáticos.
Até o fim do primeiro bimestre do ano, o mercado brasileiro havia comprado apenas 20% do volume de fertilizantes esperado para 2024, metade do percentual comercializado em anos anteriores nessa época, quando estava perto de 40%, de acordo com a Yara, multinacional norueguesa que lidera o mercado de nitrogenados no país.
“Está gerando um estresse muito alto na cadeia logística, estamos prevendo vários gargalos na cadeia logística para frente”, disse o presidente da Yara Brasil, Marcelo Altieri, após evento em Brasília. “Nunca vimos uma realidade de compra tão atrasada em relação ao avanço do ano, então pode trazer problemas logísticos”, completou.
A multinacional não informou números específicos sobre a expectativa de vendas de fertilizantes para 2024, mas disse que o ritmo mais devagar é uma realidade do mercado em geral.
Esse atraso pode gerar problema de distribuição e logística no país nos próximos meses, pois quando as vendas fluírem, os pedidos nas revendas podem se acumular e o adubo pode não ser entregue na época certa para o plantio da safra 2024/25.
Um levantamento da consultoria StoneX indica que o volume de vendas de fertilizantes para entrega no primeiro semestre do ano chegou a 51% até fevereiro. Um ano antes, esse percentual de comercialização era de 62%, e até fevereiro de 2022, de 60%.
Para as entregas previstas no segundo semestre — quando começa o calendário agrícola da safra 2024/25 —, também há uma menor taxa de comercialização, em torno de 20%. Em comparação com os últimos dois anos, o índice era de 30% nesse período.
Segundo a israelense ICL, que produz minerais e fertilizantes especiais, a expectativa é que o cenário se reverta nos próximos meses, dadas as condições favoráveis de relação de troca (indicador que mede a capacidade de compra) entre os fertilizantes e os grãos.
“A retomada do mercado é fundamental para evitar transtornos logísticos e a consequente dificuldade de acesso às tecnologias por parte do produtor”, disse Ithamar Prada, vice-presidente de Marketing & Inovação da empresa. Segundo ele, o produtor está focado agora no fechamento da safra e avaliando as condições de comercialização da soja.
Altieri, da Yara, concorda que os produtores rurais têm esperado até o último momento para tomar a decisão de compra. Em 2023, o atraso nas aquisições se deu pela expectativa de preços mais baixos. Mesmo assim, a cadeia conseguiu se organizar e atender à demanda.
“Este é um ano diferente. As tendências não são as mesmas, muitos produtos já estão no piso [de preço] e alguns já recuperando posição. Quanto mais para a frente o agricultor esperar, mais problema do ponto de vista logístico poderemos enfrentar na safra”, apontou Altieri.
As dúvidas geradas pelos atrasos nas compras ainda não abalaram o cenário de estabilidade projetado para 2024. Segundo Altieri, os níveis de rentabilidade do setor agrícola e das indústrias de fertilizantes voltaram aos patamares pré-pandemia após anos de altos e baixos históricos no mercado em 2022 e 2023, respectivamente.
“Nessa transição, houve muito sofrimento, muita dor, muita queda de preço. Foram quase 12 meses em que os preços dos fertilizantes estiveram em queda. Foi muito desafiador. Mas este ano é de estabilidade”, afirmou.
No entanto, o executivo admitiu que o cenário de dificuldades financeiras no campo, com a disparada nos pedidos de recuperação judicial por empresas do agro e produtores, preocupa o mercado.
“O agricultor é quem paga as contas de todas as nossas empresas. Se o agricultor está sofrendo, é algo que nos preocupa e que queremos trabalhar para, através da geração de mais produtividade para o agricultor, mais qualidade e mais rentabilidade, contribuir para que esse cenário seja revertido da maneira mais rápida possível”, disse Altieri