“Tabagismo é doença pediátrica”. A frase, dita durante o Workshop Estadual sobre Comércio Ilícito de Produtos Fumígenos e seus Malefícios à Saúde, realizado nesta terça-feira (25), revela a gravidade do problema que atinge especialmente os mais jovens. O evento, que enfatizou os perigos dos cigarros eletrônicos, como “vapes” e “pods”, destacou como esses dispositivos estão se tornando a principal porta de entrada para o tabagismo entre adolescentes.
A OMS (Organização Mundial da Saúde) classifica o tabagismo como uma doença pediátrica, já que a maioria dos fumantes desenvolve dependência antes dos 19 anos. Dentro desse contexto, a psicóloga Vera Lúcia Borges, representante do Inca (Instituto Nacional de Câncer), alerta que os dispositivos eletrônicos estão reconfigurando o mercado do tabaco ao atrair o público jovem com aromas, sabores e designs variados.
“Está sendo criada uma nova população de fumantes, que vai adoecer precocemente e, como consequência, terá uma qualidade de vida muito ruim. Isso é impulsionado pela ideia equivocada de que estão consumindo um produto cheiroso e com menos substâncias nocivas à saúde, o que não é verdade”, explica Vera.
É importante relembrar que os dispositivos eletrônicos não são menos prejudiciais do que os cigarros tradicionais. Apesar de não conterem tabaco, eles têm outras substâncias prejudiciais à saúde, como acetona, acroleína, formaldeído, aldeído e nicotina. Além disso, apresentam riscos como explosões de bateria.
Durante sua fala, Vera apontou que o tabagismo, incluindo o uso desses dispositivos, é um dos principais fatores de risco para diversos tipos de câncer. Dados do Inca revelam que, entre 2023 e 2025, devem surgir anualmente 704 mil novos casos de câncer no Brasil, muitos deles relacionados ao consumo de tabaco.
Estima-se que, no mesmo período, serão registrados: 15.100 casos de câncer de cavidade oral; 10.950 de câncer de esôfago; 11.370 de câncer de bexiga; e 7.790 de câncer de laringe.
No Mato Grosso do Sul, o consumo de cigarros eletrônicos é alarmante. Conforme noticiado anteriormente, com 4% da população usando esses dispositivos, o Estado ocupa a segunda posição no ranking nacional, atrás apenas do Paraná (4,5%). Entre jovens de 18 a 24 anos, o índice é ainda mais preocupante: 14,9%.
Apesar da proibição da fabricação, comercialização e importação de cigarros eletrônicos pela Anvisa desde 2009, os produtos são facilmente encontrados. A localização geográfica do Estado, com fronteira próxima ao Paraguai e Bolívia, é um dos grandes desafios para a fiscalização, já que há uma disparidade nas legislações.
“Ponta Porã é um desses casos, porque é só atravessar a rua que você encontra cigarro eletrônico. Essa proximidade gera confusão entre os consumidores, que acreditam que, se é permitido lá, não faz mal aqui. Por isso, é fundamental educar a população sobre os riscos desses produtos e reforçar a fiscalização”, explicou Vera.
Combate em conjunto – Em MS, diversos órgãos atuam na fiscalização e coibição da venda de cigarros eletrônicos. O Procon-MS é um desses órgãos, que trabalha em parceria com a Vigilância Sanitária e a Decon (Delegacia de Repressão aos Crimes de Relação de Consumo).
Durante as ações de fiscalização, a fiscal do Procon-MS, Ana Cecília Duncan, aponta que a situação é ainda mais grave porque os cigarros eletrônicos estão chegando às escolas.
“Não são apenas adolescentes do ensino médio; temos encontrado crianças do ensino fundamental usando esses dispositivos. Esses jovens, quando adultos, terão sua saúde seriamente comprometida, o que pode colapsar nosso sistema de saúde no futuro”, alertou Ana Cecília.
Diante desse cenário, o Projeto Sustentabilidade no Programa Nacional de Controle do Tabagismo tem atuado em Mato Grosso do Sul desde o início deste ano. O projeto busca identificar vulnerabilidades, implementar melhorias e integrar profissionais de saúde e educação para desenvolver estratégias eficazes de combate ao tabagismo. A cidade de Ponta Porã foi uma das localidades analisadas no primeiro estudo em MS.
“Estamos trabalhando para engajar diversos parceiros e potencializar as ações de controle. Os avanços que tivemos aqui no estado mostram como é possível atuar de forma integrada, sempre visando saúde e qualidade de vida”, concluiu Vera.