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Governo estuda medidas para tentar zerar qualquer desmate

Num momento em que atenções se voltam ainda mais para a questão ambiental, no Brasil e no mundo, o governo federal estuda um conjunto de medidas para incentivar proprietários rurais a não desmatarem nem mesmo áreas de floresta nativa que hoje, legalmente, podem ser desmatadas.

Uma das ideias em debate é garantir linhas de crédito rural com juros mais baixos a produtores que optarem por manter áreas de florestas maiores do que o exigido pela lei. Outra ideia é a ampliação da outorga de captação de água para irrigação de plantios em fazendas onde o desmatamento — legal ou ilegal — deixe de existir.

O Código Florestal estabelece percentuais de floresta nativa que podem ser derrubadas em propriedades rurais. Os percentuais variam de acordo com as regiões e biomas do país.

Mas a meta definida pelo governo Lula é não apenas acabar até 2030 com o desmatamento ilegal — que muitas vezes se dá em áreas públicas invadidas e griladas — como também com o desmatamento legal previsto no Código Florestal. O desmatamento legal se dá, em grande medida, em propriedades rurais privadas, para ampliação de áreas de plantio e de pastagem.

A meta sobre o desmatamento legal gera críticas entre empresários do agronegócio.

Um primeiro ponto levantado é: se o desmatamento até certo percentual é permitido pelo Código Florestal, como o governo pretende chegar ao desmatamento legal zero? Planeja alterar o regramento jurídico que norteia toda a atividade agropecuária no Brasil?

Numa carta enviada no começo do mês à secretária nacional da Mudança do Clima, Ana Toni, representantes de segmentos do agronegócio afirmaram que a meta sobre o desmatamento legal contraria o Código Florestal e que há falta de clareza sobre qual é o plano do governo Lula.

Segundo os signatários, quase um ano se passou desde que o presidente se comprometeu a zerar o desmatamento — qualquer que seja ele — até 2030, durante a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, em Dubai.

“Quase um ano se passou pós Dubai e ainda não conseguimos entender como pretendem cumprir o fim do desmatamento legal quando sequer o ilegal está equacionado”, diz a carta que tem entre os signatários André Nassar (Abiove, que reúne exportadores de soja), Fernando Sampaio (Abiec, dos exportadores de carne), Marcello Brito, do Centro Global Agroambiental, ligado à Fundação Dom Cabral), Pedro de Camargo Neto (pecuarista) e Sérgio Bortolozzo (Sociedade Rural Brasileira).

Em entrevista à reportagem, André Lima, secretário Extraordinário de Controle do Desmatamento e Ordenamento Ambiental Territorial do Ministério do Meio Ambiente (MMA), falou do caminho que o governo planeja seguir e das opções em debate para o desmatamento legal zero.

O desmatamento legal e ilegal zero é uma meta que, segundo ele, vale para todos os biomas.

O governo parte de três premissas. A primeira, segundo Lima, diz respeito à atividade criminosa. “É preciso combater e zerar o desmatamento ilegal usando de todas as ferramentas que temos. Na Amazônia, o ilegal representa mais de 90% de todo o desmatamento. Então é comando e controle, com Ibama, Polícia Federal, órgãos da Justiça para zerar essa atividade”, disse.

Acabar com a supressão ilegal de floresta até 2030 dependerá, afirma o secretário, “da vontade política e da capacidade de articulação com os Estados”.

A segunda premissa tem a ver com o desmatamento legal. Lima diz que o caminho não é o de confrontar o Código Florestal nem de alterá-lo. Mas de criar incentivos que levem os produtores a decidir que é vantajoso não desmatar.

Uma das hipóteses é que o governo passe a ter linhas de crédito rural com juros mais baixos para quem se comprometer a não desmatar mais, diz Lima. “Outra ideia seria o pagamento por serviços ambientais a proprietários de terra para que ele, voluntariamente, não desmatem mais as áreas a quem têm direito de desmatar”, afirma.

Controle

Não está claro, no entanto, como será feito esse controle. Um dos instrumentos que poderiam ser usados para monitorar áreas ainda passíveis de supressão legal, para a posterior concessão de crédito a juros mais baratos a quem não desmatar, o Cadastro Ambiental Rural (CAR) ainda está em fase inicial de análise e validação.

Essa dificuldade de comprovação é avaliada pelo governo. Uma ideia é dar o benefício a quem já tem o CAR analisado e que tenha excedente florestal na propriedade. Até junho, apenas 121,1 mil imóveis tinham o cadastro validado e estavam com a regularidade ambiental concluída. Em todo o país, são mais de 7,5 milhões de registros.

Mesmo se optar por esses mecanismos, ainda há uma dificuldade para calcular a quantidade excedente de mata nativa e de como valorar isso. As ideias estão em estágio inicial, apurou a reportagem, sem estudos mais aprofundados.

Medida semelhante foi adotada no Plano Safra para premiar produtores que já têm o CAR analisado, com desconto de 0,5 ponto percentual no crédito de custeio. Até o fim da safra 2023/24, porém, apenas 43 operações de financiamentos com recursos equalizados haviam recebido o benefício.

Lima cita outro incentivo. “Se o Estado passa a privilegiar a outorga de [captação] de água para esse produtor rural, ele ganha economicamente porque sua propriedade rural se valoriza e com mais água [para irrigação] sua produção aumenta”.

Em grandes números, diz ele, na Amazônia o desmatamento legal representa só 10% do total do desmatamento na região. No Cerrado, o desmatamento legal representa entre 45% e 50%. “Então o volume de incentivos para que possa convencer o proprietário [a abrir mão do desmate legal] vai ter que ser maior do que na Amazônia”.

Quais serão esses incentivos, como seriam aplicados na prática, são temas que ainda carecem de definição, mas que estão sendo discutidos entre ministérios.

Antes, porém, para a meta de desmatamento zero até 2030, esses mecanismos de incentivo precisam estar rodando. O secretário afirma que economistas, produtores rurais e governo têm criatividade para pensarem juntos em incentivos antidesmatamento.

Mas mesmo nos cenários mais positivos, parece improvável que todo desmatamento – legal ou ilegal – deixe de existir dentro de seis anos e meio no Brasil.

É nesse ponto que entra a terceira premissa do MMA: um amplo programa de regeneração e recuperação florestal. Se os três pontos se concretizarem, a ambição na Pasta é que em 2030, o Brasil tenha sua área florestal aumentando e não diminuindo, diz André Lima.

 Marcos Moura de Souza —Globo Rural (Colaborou Rafael Walendorff, de Brasília)

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